E Renan Calheiros está de volta, seis anos depois, ao cargo do qual renunciou para não ser cassado. Mas que sujeito ambicioso, não? Não. Renan é ganancioso.
Ao fazer o discurso de posse como presidente do Senado, Renan disse que "A ética não é um fim em si mesmo, vossas excelências sabem disso. A ética é meio, não é fim.” Ouvi o discurso, sentindo uma ponta de vergonha alheia, justamente quando gravava o podcast Café Brasil 336 - Ganância e Ambição. E foi impossível não fazer um paralelo. Vamos lá.
Sou um sujeito ambicioso. Sempre fui. Sempre mirei mais acima, mais à frente, mais fundo, mais alto, mais longe do que eu poderia alcançar. E por isso, além de quebrar a cara muitas vezes, consegui atingir certos objetivos que muita gente parecida comigo nunca conseguiu. No processo, levei junto um monte de gente: minha família, amigos, colegas de trabalho, clientes, fornecedores e até leitores e ouvintes.
Na minha ambição cabe todo mundo.
Ser ambicioso é fundamental, e ter ao lado gente ambiciosa também. Uma mulher ambiciosa, por exemplo, motiva o marido a sair da inércia, e vice-versa. Quem tem ambição quer crescer, evoluir, progredir. Quem não tem, “deixa a vida te levar, vida leva eu...”. A ambição equilibrada é positiva, é boa. Ambição desequilibrada se transforma em ganância.
Nos dicionários, a diferença entre ambição e ganância não é tão clara, mas para mim é: o que difere a ganância da ambição são os limites de cada uma e os princípios morais: o como fazer. Vejamos as definições que elaborei, quem sabe você concorda com elas.
A ambição é o desejo intenso de alcançar determinado objetivo, aplicando-se os princípios éticos vigentes. O indivíduo ambicioso contempla em seus planos outras pessoas, age com honestidade e generosidade e respeita todos que estão à sua volta. E “todos”não são apenas amigos, parentes ou os outros elementos do bando.
Já a ganância é o desejo intenso de alcançar determinado objetivo, seja pelo meio que for. Os fins justificam os meios, lembra disso? O indivíduo ganancioso só se importa consigo mesmo, não contempla mais ninguém em seus planos e faz qualquer coisa para atingir seus objetivos, doa a quem doer.
Então vamos lá: tenho a ambição de governar este país, e o faço seguindo princípios éticos, conforme meus valores morais, até trombar na tal “governabilidade”. Quando estou pensando em como fazer para vencer esses obstáculos, ouço que "a ética é meio, não é fim”, e adoto a moral dos gananciosos: sujo as mãos, faço conchavos, me alio a notórios bandidos e, quem sabe, compro uns votos para conseguir aprovar as medidas que eu afirmo que serão boas para o povo. E assim atinjo o fim desejado.
A eleição de Renan Calheiros deixa claro que, para nossos congressistas, ética é apenas uma ferramenta, como uma chave que eles usam para abrir fendas. Ou para matar você.
“Tudo bem, se me convém.” Continuo propondo essa frase em substituição ao “Ordem e Progresso”.
*Luciano Pires
*Editor do Café Brasil. Publica seus artigos às sextas-feiras.